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Livro: “Agência De Notícias” - Psicografia: Francisco Cândido Xavier
Autor Espiritual: Jair Presente
A EVOLUÇÃO DO AMOR
Jair Presente
O Doutor Leonel de Souza
Dono de terra e dinheiro,
Trazia a cabeça em fogo,
Hora a hora, dia inteiro.
Tinha uma filha somente,
A jovem Ana Maria,
Que lhe dera ao coração
A presença da alegria.
Ela, porém, namorava
O jovem Joaquim Mutamba,
Sempre juntos, noite a noite,
Lembravam corda e caçamba.
Sabendo que os dois se amavam
Com manifesta loucura,
O pai ficou alarmado
E disse à filha, insegura:
- “Ana Maria, você
Não mais procure Joaquim,
Considere o seu romance
Um caso que chega ao fim.
Largue, filha, enquanto é tempo,
Esse Joaquim do pé torto,
Um varredor de cinema
Não tem onde cair morto...”
A filha pediu, no entanto:
- “Pai, rogo à sua bondade,
Quero casar com Joaquim,
Já temos intimidade!...”
O velho esmurrou a mesa,
Dando mostra de machão,
E asseverou, irritado:
- “Não aceito, não e não!...”
O pai buscou, no outro dia,
Um famoso pistoleiro...
Queria um tiro no moço,
Pagaria bom dinheiro.
O pistoleiro, maldoso,
Que era pobre, muito pobre,
Comunicou ao cliente:
- “Sinto fome do seu cobre...”
Semana passa semana,
E o pistoleiro com jeito,
Derrubou Joaquim, a tiros,
Num crime duro e perfeito.
Ninguém viu a cena triste...
No povo, apenas mumunhas.
Buscou a polícia, em vão,
Informes e testemunhas.
Ana Maria chorou
Por muitos e muitos dias,
Parecia torturada
Por íntimas agonias...
O pai cercou-a de mimos,
Sentindo arrependimento
E a moça continuava
Toda entregue ao sofrimento...
Notei com grande surpresa
Que ela trazia de lado,
Em todo passo do dia,
Mutamba desencarnado.
Quatro anos se passaram...
Veio o estouro de repente;
A jovem Ana Maria
Teve um novo pretendente.
Era um rapaz educado,
Um competente engenheiro...
O pai fez o casamento
Gastando muito dinheiro.
Morrer não fora vantagem,
De coração renovado,
A moça trouxera à luz
O primeiro namorado.
Decorridos onze meses
Surgiu a reviravolta...
Um pequenino nasceu...
Era Mutamba, de volta.
Tudo era festa em família,
Felicidade, alegria...
O genro e o sogro, contentes,
Beijavam Ana Maria.
O pequenino ante o seio
Sugava o leite com gana
E eu ficava refletindo
Nas tricas da vida humana.
O avô, vendo o neto ativo
Parecendo esfomeado,
Exclamava, todo dia:
- “Eta, menino danado!...”
A HERANÇA
Jair Presente
- “Quero fazer caridade” –
Dizia Júlio das Graças,
Estou cansado de ver
Tanta penúria nas praças;
Vejo mães abandonadas,
Cujo estômago jejua,
Crianças esfarrapadas
Em tristes bandos na rua...
Se Jesus me der recursos,
Farei com muita alegria
Um lar onde os pobres tenham
O pão para cada dia.
Tanto Júlio falou nisso
Que o difícil sucedeu:
Júlio ganhou grande herança
De um tio que faleceu.
Era um antigo solteirão
Que não mostrava riqueza
E o povo considerava
Sovina por natureza;
Ao morrer, viu-se-lhe a vida,
Revelou-se-lhe o caminho...
Tinha mais de dois bilhões
E deixou tudo ao sobrinho.
Após reter a fortuna,
Alguns irmãos da cidade
Vieram a ele indagando
Dos votos de caridade.
Que faria, enfim, agora?
Perguntou-lhe a comissão:
- “Um lar para os enjeitados
E velhos sem proteção?”
Respondeu Júlio, entretanto,
- “Meus amigos, o dinheiro
Que o tio me destinou
Não dá para um galinheiro.
Mais tarde, conversaremos,
Somos amigos leais...
Os dois bilhões de meu tio
Vêm a ser pouco demais.”
ABERTURAS
Jair Presente
O problema assim começa:
Uma frase de ironia,
O grito fora de tempo,
O gesto de grosseria;
A vibração deprimente
De todo olhar ofensivo,
O barulho inesperado
Da discussão sem motivo;
O fel da maledicência
Que da boca se desloca,
O apontamento infeliz,
O cochicho da fofoca;
A conversa muito alta,
A resposta de machão,
O melindre exagerado
Da ausência de educação;
A brincadeira sem graça
De qualquer toque eu assusta,
O veneno que se espalha
De toda palavra injusta;
A queixa de toda hora,
O choro sempre constante,
O vinagre da censura,
O riso desconcertante;
A voz de fera acuada
Que surge da irritação...
- Eis algumas aberturas
Das tramas da obsessão.
ANOTAÇÃO BREVE
Jair Presente
Meu amigo, ao responder-lhe
O confiante recado,
Reafirmo-lhe o refrão:
- “Cuidado! Muito cuidado!...”
Veja o relógio e trabalhe,
Fuja da hora perdida,
Atenda às obrigações
Que lhe competem na vida.
Não estou aconselhando,
Rogo a você que me entenda,
Também eu vivo em meus erros
Que nem cana na moenda.
Guarde calma e nada diga
Na hora da irritação,
Não queira a barra pesada
Que surge do palavrão.
Conserve tato e prudência,
Mantendo firmeza e raça;
E não beba cousa alguma
Do que lhe cheire a cachaça.
Não viva pedindo aos guias
Auxílio em muitas matérias,
Em muitas ocasiões
Os guias estão de férias.
Bate-boca não resolve,
Violência agora é onda,
Se alguém lhe dirige ofensas,
Afaste-se e não responda;
Na estrada de cada dia,
Cumpra o seu próprio dever,
Quando um problema aparece,
O momento é de aprender.
CARMELINO
Jair Presente
Uma história curiosa,
Encerrando muito ensino,
É a que vi acontecendo
Ao nosso irmão Carmelino.
Era ele um servidor
Que conquistou nosso apreço,
Viera no Grande Espaço
De um mundo que não conheço.
Passeava pela Terra,
Vendo as árvores copadas,
Adorava o sol no verde
Dos campos e das estradas.
Parava junto das flores,
Ficando feliz ao vê-las,
Dizia que todas elas
Eram irmãs das estrelas.
Supondo o mundo perfeito,
Solicitou ao seu Guia:
Queria viver na Terra,
Respirar um novo dia...
O amigo escutou com calma
E disse a ele: “primeiro,
Procure ficar uns dias
Em casa de um companheiro.
Uma semana somente
Com família de seu nível...
Depois, veremos sem pressa
Aquilo que for possível”...
Carmelino se instalou,
Em corpo espiritual,
No lar generoso e amigo
Do irmão José Juvenal.
Juvenal era casado,
Mulher, dois filhos e emprego,
Morava em cidade grande,
Mas vivia sem sossego.
Atencioso e distinto,
Servia num armazém,
Por residir no subúrbio,
Cedinho, tomava o trem.
A esposa ficava em casa,
Dando assistência aos meninos,
Que se espancavam com fúria,
Em gritos e desatinos.
Mas era grande o pampeiro
E a mulher a lastimar-se,
Hora a hora, dia inteiro...
Juvenal voltava à casa,
Muito além do anoitecer,
Depois de uma sopa leve,
Tinha contas a rever.
Sentava-se, acabrunhado,
A força se lhe esbatia,
Sentia-se fatigado
Das contas de todo dia.
Eram contas de armazém,
Concertos de geladeira,
Exigências da farmácia,
Cobranças da costureira.
Eram contas do colégio,
Pedidos do entregador,
Listas das compras de casa
E preços do encanador.
Folheava novas contas,
Detalhes da prestação
Do aparelho que comprara
Com nova televisão.
Eram contas do padeiro
E notas da leiteria,
Todas mostravam aumento,
Subindo, dia por dia.
Finda a semana de estudo,
Carmelino veio a nós,
Parecia birutado,
De olhar distante e sem voz.
Veio o Guia recebê-lo,
Dizendo-lhe: Carmelino,
Você viverá na Terra,
Ganhará novo destino...
Está você satisfeito?
Seu novo berço estou vendo”...
Mas Carmelino, em silêncio,
Chorou e fugiu correndo...
CASO DE VITORINO
Jair Presente
Disse o Guia:”Vitorino,
A mais importante norma
De sublimar a existência
É a nossa própria reforma.
Não se descuide. Inda agora,
Ouça o aviso do Além,
Ninguém consegue elevar-se
Sem renovar-se no Bem.”
Respondeu o interpelado,
Humilde, baixando o olhar:
- “Repito-vos, caro Guia,
Eu prometo melhorar.”
Muito embora, Vitorino
Fosse ao grupo de oração,
Fora do grupo, era ele
A própria contradição.
Negociando ouro e jóias,
Bebia sempre onde ia.
Transtornado, de repente,
Insultava e discutia.
Mantinha a esposa e dois filhos,
No entanto, chegando em casa,
Era um ébrio renitente,
Mostrando os olhos em brasa...
Espancava a companheira
Pobre louco em desatinos,
Em seguida ao quebra-quebra,
Espancava os dois meninos.
Ameaçava os parentes,
Rixava por frase à toa,
Chegando a noite das preces
Parecia outra pessoa.
No grupo, o guia amoroso,
Continuava a falar,
Vitorino respondia:
- “Eu prometo melhora.”
-
No outro dia, a mesma nota,
Era a pessoa insegura,
Bebia constantemente,
Quase atingindo a loucura.
Vitorino possuía
Outra casa e outra mulher,
Gritando para os vizinhos:
“Tenho a vida que eu quiser...”
Essa infeliz criatura,
Se o bebum aparecia,
Também sofria, humilhada,
Injúria e pancadaria.
A essa mulher Segunda-feira
Ele chamava de “estepe”,
Era uma jovem doente,
Magrinha que nem ganzepe.
Chegando a noite das preces,
Eis o Guia a aconselhar,
Ele, porém, só dizia:
- “Eu prometo melhorar.”
-
Mas os anos transcorreram,
Aos tragos, sem intervalo,
Assustado, certa noite,
Viu a morte a procurá-lo.
Todo encolhido no leito,
Sofria grande aflição,
Terríveis e fortes dores
Em torno do coração.
Ele pediu: “Morte amiga,
Deixe-me, quero sarar,
Se tenho errado no mundo
Eu prometo melhorar...”
Disse a Morte: “Não se queixe,
Entenda, prezado amigo,
Não me venha com promessas
Seu caso agora é comigo!...
Você teve muitas chances,
Muito dinheiro e conforto,
Você continua vivo
Mas o seu tempo está morto!...”
Vitorino estarrecido,
Notou a morte ao seu lado,
Depois em breves momentos
Estava desencarnado.
No outro dia, grande enterro,
Descia por flórea rampa
E duas mulheres tristes
Chorando na mesma campa.
CONCURSO DE SAMBA
Jair Presente
Foi num concurso de samba.
O nosso amigo Ribeiro
Entre os demais concorrentes,
Estava sendo o primeiro.
Moças e moços de fama,
Após ligeira merenda,
Afastavam-se da festa
Largando-se da contenda.
Ribeiro continuava
E, escorado na moringa,
De hora em hora, reclamava
Um grande copo de pinga.
A equipe dos musicistas,
Composta de gente amiga,
Doava substitutos
A quem mostrasse fadiga.
Ribeiro continuava
Tomando conta da praça,
Dançando e gesticulando,
Alimentado à cachaça.
Decorridas vinte horas,
Num grito desabalado,
Ribeiro caiu no chão...
Estava desencarnado.
Um médico trazido a exame,
Discreto, falou à parte,
Explicando a conhecidos,
Quanto à suspeita de enfarte.
O morto, de nosso lado,
Olhando o corpo no chão,
Clamava: “Jesus me valha,
Mártir São Sebastião.”
Depois, conheceu conosco
Um colega, seu amigo...
Chorando, exclamou: “Manoel,
O samba acabou comigo!...”
Manoel que lhe fora par
No Roçado do Vai-Vem,
Falou a ele: “Ribeiro,
Samba não fere a ninguém...
Quem te roubou vida e força,
Não foi samba, nem foi ginga.
Dança e música são nossas,
Quem te matou foi a pinga.”
DIA DA CRIANÇA
Jair Presente
Dia da Criança,
Tempo de esperança.
Menino que brinca e rola
Não esqueça da escola.
Em todos os locais,
Respeite os seus pais,
Não estrague, nem fira
As plantas e animais.
Menino abelhudo,
Não fuja do estudo.
Menino na estrada
Não atire pedrada.
Menino catarrento,
Não fique no vento.
Menino da favela,
Muitas vezes sem lar,
Peça o apoio de alguém,
Mas não busque furtar.
Veja as suas lições,
Por dentro de casa,
Não fique na rua,
Que a rua é uma brasa.
Seja você quem for,
Nunca perturbe a ninguém.
Criança, Criança,
Você é a esperança
Do mundo que vem.
DIA DOS PAIS
Jair Presente
Casimiro era bom pai...
E pai sempre é o companheiro
Que trabalha todo dia
Para cavar o dinheiro
Para que tanta moeda?
Ouço a pergunta, assim rasa...
Não respondo... Pai é sempre
O grande esteio da casa.
É a compra em supermercado,
Levando o caro de mão,
É a conta da leiteria,
Da luz, do gás e do pão.
É a despesa no colégio
De quatro filhos pequenos,
O preço da condução,
Sempre mais, nunca menos.
É o pagamento ao dentista,
É a grana da costureira,
O preço das aulas-extras
À criançada matreira.
É a prestação em aumento
Do pequenino lugar
Que lhe conserva a família
Na bênção do próprio lar.
É a cobrança da farmácia
Das encomendas do mês,
O pobre, em sabendo quanto,
Coça a cabeça outra vez...
É a verba particular
Que deve trazer em mão,
Para os freqüentes concertos
Da velha televisão.
É o cobre ao cabeleireiro,
A conta do eletricista,
As notas do verdureiro
Com pagamentos à vista...
Casimiro chega em casa,
Cansado, suor na testa...
Trabalhara no domingo
Mas achou o lar em festa.
Encontrou seus velhos pais,
Entre vizinhos em bando,
A esposa, o bolo mais rico
E a meninada cantando...
Sem graça, saudou a todos,
E, ao encostar-se na mesa,
O pobre via a festa,
Meditava na despesa.
Os quatro filhos cantavam:
- “Todo pai tem seu dia,
Viva o papai sempre amigo
E viva a nossa alegria!...
Viva o papai sempre amado
E viva o nosso vovô!...”
Mas a pensar em despesas,
Casimiro desmaiou.
IRMÃOS DA MESMA FAIXA
Jair Presente
Era um hábito sem pausa...
Fosse ilusão ou capricho,
O médium Joaquim de Souza
Curtia o jogo do bicho.
Não era pessoa falsa,
Não era mau companheiro,
Demonstrava apenas fome
De dinheiro e mais dinheiro.
Na manha de cada dia,
Em pensamento profundo,
Perguntava a Irmão Rosalvo
Que lhe fora irmão no mundo...
- “Que bicho teremos hoje?”
Após ligeiro intervalo,
A voz do irmão respondia:
- “Pegue o camelo e o cavalo.”
Joaquim seguia o conselho,
Promovia grande aposta:
Depois, vinha o resultado
Grande soma por resposta.
Chegava a manhã seguinte,
Concentrava-se com fé...
- “E hoje?” O irmão sugeria:
- “Pegue a cabra e o jacaré.”
Na manhã imediata,
Joaquim regressava à treta:
- “E hoje?” O irmão informava:
- “Pegue o tigre e a borboleta.”
Meses e meses passaram...
Joaquim tinha o ouro à vista,
Embora médium, subira
A grande capitalista.
Certa manhã, disse a voz:
- “Joaquim, melhore o seu taco,
Entregue tudo o que tenha
No peru e no macaco.”
Joaquim atendeu, de pronto...
Pôs as somas que ajuntara
Nos dois bichos referidos
Que a voz do Além lhe apontara.
Nesse dia, entrou em prova;
Com grande consternação,
Viu que os bichos não vieram,
Vieram gato e pavão.
Joaquim errava, magoado,
Da sala para a cozinha...
Estava pobre... Perdera
A fortuna que detinha.
Ansioso, foi ao quarto,
Entrou em prece e pediu:
- “Irmão Rosalvo, esclareça!...
O que é que você viu?
Atenda! Peço socorro,
Fale, irmão!... Pois estou fraco!...
Por que o gato e o pavão
Sem peru e sem macaco?”
A voz, porém, lhe explicou:
- “Não sou o seu companheiro,
Não sou seu irmão Rosalvo,
Eu sou a mãe do banqueiro...”
Meus irmãos, temos na terra
Um trio de fel e fogo...
Tem três nomes conhecidos:
- Ambição, cachaça e jogo.
LOUVORES ESQUECIDOS
Jair Presente
Desejo fraternalmente,
Sem argumentos compridos,
Falar sem bronca ou censura
Dos louvores esquecidos.
Estamos sempre dispostos
A mostrar nossos respeitos
Aos donos de campeonatos
E às almas de nobres feitos.
Mas na existência terrestre
Não vemos quaisquer ensinos
Para aplaudir grandes gestos
Que temos por pequeninos.
Louvemos os companheiros
Do trato de cada dia
Que conversam em voz baixa,
Evitando gritaria.
Louvemos nossos irmãos
Que, com esmero feliz,
Não se esquecem do banheiro
Para assoar o nariz.
Louvemos todos aqueles
Que atendem à obrigação
De não deixar lixo algum
Estatelado no chão.
Louvemos as amizades
Que no mundo, às vezes louco,
São afáveis e discretas,
Ouvem muito e falam pouco.
Louvemos nossos cupinchas,
Amigos da educação,
Que não falam de excrementos
Nas horas de refeição.
Louvemos qualquer pessoa
De zelo sempre maior,
Na higiene e na limpeza,
Fazendo a vida melhor.
PARA HOJE
Jair Presente
Do bem que sonhes fazer
Não teças conversa vã...
Ações no bem? Não vaciles,
Nem guardes para amanhã.
A carta por escrever,
Uma ofensa a perdoar,
Algum pequeno dever
Que não se deve adiar...
Uma visita ao doente,
Alguma doce lembrança,
A gentileza da hora,
Uma frase de esperança...
Algum socorro ao amigo
No dia da provação,
O calor da simpatia
Num leve aperto de mão...
Agindo de alma sincera,
Nunca retardes o bem.
A Morte é um anjo de Deus
Mas não espera a ninguém.
PETITÓRIO
Jair Presente
Deus nos livre de cair
Nos esculachos da rua,
Dos grudes e dos apertos
De quantos entram na pua;
Da jogada que nos faça
Tombar em vexame ou fria,
De tomar um pilecão,
Tendo a barriga vazia;
De dar uma paquerada
Sem apoio no dendém,
De companheiro fajuto
Que faz que vem mas não vem;
De viver em caixa-baixa,
Caindo pelas tabelas,
De gatinhas enturmadas
Sem sabermos quem são elas;
De festanças e garrafas,
Onde há gente de nota,
De gaturamo enrustido
Que nos desonra a patota;
De congesta e de chupão,
De caboclo mamador,
Da pessoa de mão grande
De trombada e suador...
Não sei escrever de letra,
Nem orar, como e nem quando!...
Ouça, meu Deus, o que sinto
E não o que estou falando...
PROMESSA E MUDANÇA
Jair Presente
- “Enfim” – clamou Nico Alceu
ante o Grupo e o Dirigente –
“Conforme a nota dos Guias
Serei médium claramente.”
E acrescentou, exaltado,
- “Servir em quaisquer recantos!...
Esse é o meu grande ideal,
Mas não serei como tantos...
Já conheci vários médiuns,
Atuando em nossa estrada,
Começaram em promessas
E muita fanfarronada.
Planejaram grandes obras,
Assumindo compromisso,
Mas fugiram, de repente,
De todo e qualquer serviço...
Trocaram ação e luz por prazer;
Foram eles desertores
Que nunca pude entender...
Eu, porém, quero trabalho,
Em favor dos desvalidos,
Sem cansar-me de atendê-los
Nos mais estranhos pedidos...
Terei o meu lar aberto,
No amor à mediunidade
A todos os que precisem
De paz e de caridade.”
No outro dia, ei-lo em tarefa,
Verbo calmo e gesto brando...
Falava por ele um Guia
E o pessoal foi chegando...
Inspirava compaixão
Ver tantas provas e crises!...
O médium modificou-se,
Diante dos infelizes.
Estava desencantado,
Falava com rispidez,
Sofredores que chorassem
Com ele não tinham vez.
Passadas quatro semanas,
O Diretor descontente,
Recebeu dele uma carta,
Dizia achar-se doente.
Em vão, buscaram amigos
Visitar o irmão Alceu...
Mudara o médium de Vila,
Nunca mais apareceu.
REUNIÃO COM JESUS
Jair Presente
Vale a pena observar
Os inimigos da luz
Quando procuram secar
O serviço com Jesus.
É justo considerar
Que a obra desse teor
Reclama cooperadores
Quais vigas de paz e amor.
Iniciou-se na Terra
O Evangelho em ação
Com Jesus e doze amigos,
Reunião a reunião.
Por isso é que os companheiros
Unidos em compromisso,
Quanto possível não falhem
Ao conjunto de serviço.
Os inimigos da luz
Agem de carga cerrada
Exatamente no dia
Em que a tarefa é marcada.
Na hora em que os tarefeiros
Precisam sair de casa,
Eis que o entrave aparece
Que os afasta ou que os atrasa.
É o beliscão na coluna,
É o boato que entristeça,
É a visita inesperada,
A antiga dor-de-cabeça.
É uma criança que cai
Pedindo mais atenção,
É o engano de um parente
Provocando discussão.
É a chave que se perdeu,
É o vizinho dando tecos,
É um recado sem sentido,
É o fígado em pandarecos...
Que todos os companheiros,
Estejam firmes, serenos,
Superando os veneninhos
Que surgem de outros venenos.
Que cultivem paz e calma,
Com bondade e paciência,
A reunião com Jesus
É tempo de resistência.
Meus amigos, não se prendam
A esse ou aquele galho,
Ante a Seara do Cristo,
Que ninguém falte ao trabalho.
SOVINICE
Jair Presente
Era um caso singular
O caso de João Monteiro,
Capitalista aos quarenta,
Só procurava dinheiro.
Vivia sempre isolado.
Segregação incomum,
Não cultivava amizades
Nem tinha parente algum.
E usando rasteira e treta,
Prendia com papelada
Muita gente na gaveta.
Se alguém lhe rogasse auxílio,
Considerava, brigão:
- “Para todo petitório
A minha resposta é não.”
Senhoras vinham a ele
Falando em beneficência,
Necessitavam de apoio
Para os irmãos em carência.
João dizia com sarcasmo:
- “Não desejo compromisso,
Se alguém é doente e pobre,
Eu nada tenho com isso...”
Se um menino aparecesse,
Pedindo a esmola de um pão,
Gritava: - “Saia daqui!
Menino sujo é ladrão...”
A mendigo que surgisse
Rogando-lhe algum café,
Exclamava, zombeteiro:
- “Passe bem, fique como é...”
Se alguém lhe adiava os juros
Na data prefixada,
Ouvia-lhe os desaforos,
Sofria-lhe a mão pesada.
Certa noite, João em sonho
Viu a morte... Parecia
Ver um anjo estranho e lindo
A dizer que o buscaria...
Ele pensou na fortuna
Que retinha com cuidado,
Sobressaltou-se, chorou
E implorou, acabrunhado:
- “Grande Morte, grande dama,
Preciso ainda viver;
Deixe-me... Venha mais tarde...
Tenho muito que fazer...”
Disse a Morte, brandamente:
- “O seu pedido é perfeito,
Mas o seu tempo é chegado
E o que se fez está feito.
Você me chama por grande,
Como se eu fosse rainha,
No entanto, entre as criaturas,
Sou fraca e pequenininha...”
João acordou, assustado,
Vestiu-se, pôs o boné;
Ao calçar-se, um prego solto
Feriu-lhe um dedo do pé.
Logo, logo, o dedo inchado
Impunha-lhe muita dor...
Fez banhos, colou emplastros,
Mancando foi ao doutor.
Mas tudo acabou, em vão...
Com várias radiografias,
O tétano levou João
Simplesmente em cinco dias...
TAREFA FRUSTRADA
Jair Presente
Fora ele um grande herói
Na abastança de outros dias...
Agora, doente e velho,
Agonizava Matias.
Gemia, desamparado,
Quem tanto estendera o bem...
Febril, tinha sede e frio
Mas não surgia ninguém.
Orara e dizia, humilde:
- “Jesus é o refúgio meu!...”
E quem devia ampará-lo
Naquela hora era eu...
Abnegados mentores
Que lhe escutaram a prece,
Enviaram-me a servi-lo
Em tudo quanto eu pudesse.
Caia a noite. Cheguei
Ao pequeno pardieiro,
No intuito de auxiliar
Ao querido companheiro.
Depois de assustado, ao vê-lo
Exposto na tábua nua,
Dispus-me a buscar-lhe amparo,
Mesmo fosse, rua em rua...
Pedi, em prece, aos amigos
De minha pobre existência
Que me fizessem andar
Em minha antiga aparência;
Passados breves instantes,
Entrei na licença rara:
Achava-me, tal qual eu fora:
- Corpo igual ao que deixara.
Tentando obter apoio
Que reanimasse o velhinho,
Memorizando endereços,
Fui à casa de Antoninho.
Tinha nele um grande amigo,
Falei do velho doente,
Ele gritou, espantado:
- “Você é o Jair Presente?
Embora você me lembre
Um cara amigo já morto,
Não tenho qualquer auxílio
Para os pobres sem conforto...”
Corri procurando o Sérgio,
Ele exprimiu-se, zombando:
“Se eu pudesse dar esmolas
Não vivia trabalhando...”
Saí, apressadamente,
Para a casa do Dirceu,
Ele, porém, me falou:
- “Auxílio? Primeiro eu...”
Modificando o roteiro
Procurei por Dona Clara,
Ela me disse: “Não tenho!...
A vida está muito cara...”
Tudo em vão... Sempre pedindo,
Fui a vinte moradias...
Não encontrei um vintém
Para socorro ao Matias.
Regressei, desiludido,
Ao pardieiro isolado,
Para ver como estaria
Passando o pobre coitado...
Cheguei chamando o doente...
Tudo silêncio e vazio...
Matias, naquele instante,
Morrera aos golpes do frio.
UM CASO DE OBSESSÃO
Jair Presente
Dos casos que tenho visto,
O de Antonico Vicente
É uma história como tantas
Para educar muita gente.
Dono de imensa fortuna,
Era um sovina acabado,
Quem lhe pedisse um favor
Saía desanimado.
A mendigo que rogasse
A esmola de algum vintém,
Sarcástico, respondia:
- “Espera o ano que vem.”
Um dia, chegou, no entanto,
Em que Antonico mudado,
Apareceu, de repente,
Plenamente obsedado.
Cantava, chorava e ria,
Falava em estranhas crises,
Transformara-se num pouso
De espíritos infelizes.
Conduzido a um centro amigo,
A fim de obter socorro,
Ele chegou a clamar:
- “Não agüento!... Sei que morro!”
-
Depois de preces e passes,
Veio o Guia acalentá-lo...
Antonico, de improviso,
Melhorou quase de estalo.
Por quatro meses de bênção,
Voltou a ser folgazão,
Largou as más influências,
Curou-se da obsessão.
Era, porém, sempre o mesmo...
Nada de agir para o bem
Fosse qual fosse o pedido,
Não amparava a ninguém.
Findos dez meses de paz,
Disse-lhe o guia: “Antonico,
Não deixe de trabalhar,
Recorda que és forte e rico.”
- “Que fazer?” – perguntou ele...
Disse o Guia – alma sincera –
“Socorre aos necessitados,
A caridade te espera.
Abandona a sovinice!...
Meu amigo, escuta e pensa.
Auxilia as boas obras
Sem aguardar recompensa.
O tempo segue e não pára”...
Atende, meu companheiro,
Distribui na caridade
Um tanto de teu dinheiro!...”
Mas, ouvindo esses conselhos,
Antonico, sem razão,
Xingou a beneficência
E entrou em perturbação.
Por muitos anos, bradou:
- “A ninguém darei meu cobre...”
Antonico alimentava
O medo de ficar pobre.
E gritou até morrer
No Sítio de João do Zorro,
Comendo barro e clamando:
- “Não aguento! Sei que eu morro!...”
UM MÉDIUM
Jair Presente
“O que vem a ser um médium?”
Esta pergunta travessa
Demonstra que você traz
Muitos grilos na cabeça.
O médium é uma pessoa
Que trabalha, luta e sente,
Alegra-se, sofre e chora
Qual acontece com a gente.
Costuma ter batedeira,
Desarranjos de bexiga,
Dor nos rins, urina solta,
Fraqueza e dor de barriga...
De estômago delicado,
Muitas vezes, sente azia,
Vesícula complicada,
Engulho e disenteria.
Sempre que coma demais
Dos pratos que tem à mão,
Aflige-se em mal-estar
Ou geme na indigestão.
Tem febre e dor-de-cabeça
Quando apanha resfriados,
Quase sempre, traz no corpo
Os nervos destrambelhados.
Em amor, tem simpatias
Como acontece a qualquer
Se é mulher, pensa no homem,
Se é homem, pensa em mulher.
Necessita, nesse assunto,
De instrução e de doutrina,
Porque amor, em qualquer tempo,
Não dispensa a disciplina.
Se você quer ser um médium,
Conserva a fé que não cai,
Agarra-te a Jesus Cristo,
Aprende a servir e vai...
VOTO DE AMIGO
Jair Presente
Recebi a sua carta
Na qual encontrei o ensejo
De escrever-lhe esclarecendo
Aquilo que lhe desejo.
Não posso dizer-lhe tudo
Quanto quero e mais me agrade,
Peço a Jesus que lhe dê
A luz da felicidade.
Mas alguns pontos ligeiros
Posso aqui assinalar,
Por tratarem claramente
De seu próprio bem-estar.
Deus o livre de ambição
Sobre as posses do vizinho,
Das palavras mal faladas,
Das tentações do caminho.
Deus o livre do costume
De pular cerca ou porteira,
De qualquer moça fogosa,
De mulher alcoviteira.
Peça a Jesus que o socorra
Com recursos naturais,
Peça o que se faz preciso,
Mas não peça o que é demais.